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O Regente, o Coro e o Público

  • Foto do escritor: Grupo Vocal Ligaleve
    Grupo Vocal Ligaleve
  • 26 de abr. de 2015
  • 5 min de leitura

O grande ritual da tribo do Canto Coral é a apresentação. É o momento tão esperado do encontro de um coro e seu regente com o público, um grupo anônimo, ou mais ou menos anônimo. É o momento em que uma forte influência é exercida de ambos os lados, um momento de transformação, tanto para o coro e seu regente como para o público.

Foto: Anderson Guimarães

O que leva uma pessoa a ir assistir a uma apresentação de um coro? Inicialmente, devemos nos dar conta de que há dois tipos de público para uma apresentação de um coral. O primeiro grupo eu chamaria de público ativo e o segundo de público passivo. Este segundo grupo é constituído por aquelas pessoas que acabam assistindo a um coro no contexto de um evento maior: uma cerimônia cívica ou religiosa, um jantar, um evento ao ar livre, etc. Ou seja, as pessoas deste grupo não estão preparadas ou abertas para o que vai ocorrer. O primeiro grupo é constituído por aquelas pessoas que se dirigem a um determinado local para assistir a uma apresentação de um coro específico, ou de vários coros. Neste grupo contamos, antes de tudo, com os familiares dos coralistas e do regente, público sempre fiel e, muitas vezes, a única audiência presente. Em seguida, vêm os amigos ou colegas, que assistem à apresentação para prestigiar os coralistas ou o regente. Esses dois grupos assistem à apresentação, antes de tudo, pelos laços afetivos. Mas há outras motivações: prestigiar o movimento do Canto Coral em sua

comunidade, prazer estético pura e simplesmente, prestigiar um determinado coral pelas suas qualidades, desejo de conferir a execução de determinada obra por aquele coral, etc.

A relação de qualquer intérprete com sua platéia é sempre complexa. Há sempre a necessidade de ser bem recebido e apreciado pelo público. Afinal de contas, na maior parte dos casos, o intérprete está trazendo o resultado de um longo trabalho de preparação, dando tudo de si, fazendo algo em que acredita profundamente. Num coro, as expectativas em relação à reação do público são ainda mais complexas. São vários indivíduos, cada um com uma história psicológica diferente, com expectativas diferentes. E tudo isso, o regente tem que saber administrar muito bem, além de sua própria expectativa.

A recompensa vem, simbolicamente, com o aplauso. Mas há muitas circunstâncias de aplausos. Há tipos de coro ou de obras que ensejam manifestações de grande espontaneidade por parte do público, ao final da apresentação. Mas há também um tipo de repertório mais denso, mais complexo, que costuma deixar o público reflexivo, não se permitindo uma reação espontânea.

A experiência tem me demonstrado que esse tipo de reação é muito profundo e muito valioso. O problema é fazer o coro entender esse tipo de reação, introvertida e não ficar frustrado com a aparente falta de calorosidade da audiência.

O fio condutor de uma apresentação é, normalmente, o repertório, ou seja, o conjunto de peças apresentadas. Mas um programa é muito mais do que simplesmente uma série de obras, uma depois da outra.

O programa deveria ser como se fosse uma única obra, em várias seções. A montagem da ordem das peças numa apresentação, é, assim, um fator de suma importância para o sucesso da apresentação, tanto no aspecto puramente estético como no técnico. No aspecto estético, a construção de uma determinada lógica dentro de um programa com várias obras faz com que algumas sejam realçadas e outras assumam um caráter apenas complementar. É inevitável esse jogo de claro / escuro. Cabe ao regente construir seu quadro, de acordo com os princípios estéticos que valoriza, e que possam ser entendidos, tanto pelo coro, como pelo público, sem muita necessidade de verbalização.

Mas há, também, os aspectos puramente técnicos. Numa apresentação mais longa, por exemplo, a distribuição das obras, de acordo com as potencialidades do grupo, vocais e de concentração, pode ser um fator de sucesso ou de fracasso.

Sendo cada grupo um grupo, e tendo cada conjunto de obras suas especificidades, não há como definir qual seria esse ideal. A única questão é que o coro deve estar sempre renovado em suas energias, a cada peça que executa. Questões técnicas mais sutis também podem influenciar no resultado da apresentação. Chamo a atenção, especialmente, para as relações tonais entre as obras que estão sendo executadas. Várias peças seguidas, em mesma tonalidade, podem levar à fadiga, tanto do coro quanto do público. No coro, esse aspecto acaba se refletindo na afinação, que tende a baixar. Por outro lado, executar uma obra, por exemplo, em Ré maior e a seguinte em Lá bemol maior, uma relação de trítono, pode dar um nó na cabeça dos coralistas. Ou executar uma obra em Mi maior e a seguinte em Fá maior, pode fazer com que a segunda queira se acomodar na tonalidade da primeira, um semitom abaixo. Nesse último caso, uma inversão das peças tende a ser mais efetiva.

A duração de um concerto coral deve ser bem pensada, ainda mais se for a cappella. Por mais bem preparado que esteja o grupo, ou por melhor e diversificado que seja o repertório, o meio tímbrico uniforme tende a cansar a platéia. Sou sempre da opinião de que é melhor fazer uma apresentação não muito longa e deixar a audiência com a sensação de “quero mais”, do que fazer uma apresentação longa e criar a sensação de que “está muito bom, mas poderia acabar logo”.

Embora um coro dependa muito da aprovação do público que vai ouvi-lo, não pode se deixar estar sempre na mão do público, só vindo a executar tipos de obra que aquele público está acostumado a ouvir, ou da maneira que ele está acostumado a ouvir. É necessário inovar, sempre. Dentro da perspectiva da transformação, na qual venho insistindo neste texto, é importante dar oportunidade ao público de vir a conhecer novas obras, ou novas maneiras de executa-las, mesmo correndo o risco de uma possível desaprovação, num primeiro momento.

É preciso ter grande respeito pelo público, qualquer que ele seja. Há coros, por exemplo, que se recusam a cantar para platéias mais simples, ou de trazer para essas platéias obras mais densas ou “difíceis”. A minha experiência demonstra que a platéia, quanto mais simples ou humilde é, mais se envolve na apresentação, mesmo com obras mais “difíceis”. Para essas pessoas, todo gesto sincero de doação é muito importante. A gratidão que essas pessoas costumam expressar ao final das apresentações é sempre comovente e estimulante. É preciso difundir a boa música para todos, sem distinção de credo, cor, situação social ou idade. Há muitos canais pelos quais passa a compreensão e a emoção geradas por uma obra musical.

O respeito pelo público pode se manifestar, finalmente, também, em explicações sobre as obras que estão sendo executadas. Não há audiência que não aprecie.

Por Carlos Alberto Figueiredo em "Ensaios - sobre a múscica coral brasileira" 2ª Edição, FUNARTE, 2010.

 
 
 

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